Colina #1 | Alexandre Pereira

Só haverá liberdade a sério quando houver a educação para a paz, a sustentabilidade e a regeneração

Por Alexandre Pereira


“Só há liberdade a sério quando houver a Paz, o Pão,
Habitação, Saúde, Educação…”

Sérgio Godinho

Tantas vezes entoei esta canção, buscando sentido em cada uma das suas palavras, ainda hoje por cumprir. Nos últimos quinze anos, dediquei parte da minha busca pessoal e profissional aos temas da Paz, da ecologia e da educação para a sustentabilidade, trabalhando com organizações não governamentais que buscam outros modelos de ensino e de educação transformadora e alternativa.

Quando estamos finalmente num momento de convergência de múltiplas crises globais, de múltiplas guerras no mundo, a começar pela que temos às portas da Europa, na Ucrânia, que ameaça toda a estabilidade e equilíbrio do espaço Europeu; quando vemos regressarem velhos fantasmas do passado, do fascismo, do neo-nazismo, da xenofobia, num casos mais suavizados, vindo “com pezinhos de lã” como cantava o Zeca, noutros assumidamente e descaradamente a mostrar os dentes, como foi a invasão do Capitólio, a ascensão das extremas-direitas por toda a Europa, e à hora que escrevo esta crónica, com a ameaça velada de uma vitória da M. Le Pen em França, que poria todo o projecto europeu em questão; quando tudo acontece perante os meus/nossos olhos, percebemos que mesmo estando a viver à mais tempo em democracia do que em ditadura, a educação e o sistema educativo, não foram ainda capazes, de promover as transformações sistémicas necessárias para uma verdadeira transformação das mentalidades, através da implementação nas nossas sociedades de culturas e sistemas mais participativos, democráticos e abertos. Já para não falar da importância do aprofundamento do estudo da história, da filosofia, da cidadania, da ética.

No entanto saibamos celebrar o que Abril nos trouxe de bom, e saibamos validar, e valorizar essas conquistas inequívocas, que vieram agora a ser validadas por um estudo da OCDE. Segundo este estudo, podemos concluir que o sistema educativo português, nos últimos 25 anos, teve “melhorias históricas” no diz respeito ao acesso e concretização da inclusão na educação, apesar de ainda persistirem diferenças nos resultados das aprendizagem e no bem-estar dos alunos dos grupos sociais mais desfavorecidos. A conclusão desta avaliação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) sobre a política e as práticas de educação inclusiva, foi realizada no contexto do projeto “Strength through Diversity”, do qual saiu o relatório, intitulado Review of Inclusive Education in Portugal, publicado recentemente.

Saber que a Liberdade conquistada por Abril permitiu conquistar uma educação inclusiva, com autonomia e flexibilidade curricular com “progressos importantes”, mesmo apesar da pandemia é algo para celebrar no dia 25!
Saber que em 2022, “a percentagem de pessoas entre os 25-64 anos em Portugal que concluíram pelo menos o ensino secundário aumentou de 20% em 1992 para 47% em 2016 e 55% em 2019”, é motivo para celebrar no dia 25!
Saber que “a taxa de abandono escolar do secundário diminuiu de 17% em 2005 para menos de 1% em 2019, tendo sido a taxa mais baixa entre os países da OCDE”, é motivo para celebrar dia 25!
Saber que em 2019, pelo menos 90% dos alunos dos 4 aos 17 anos estavam inscritos no sistema educativo, enquanto em 2010 a mesma percentagem tinha sido atingida mas apenas no segmento dos 4 aos 14 anos, é motivo para celebrar no dia 25!

Existem muito mais dados quantitativos e qualitativos para celebrar a Democracia nestes dias que correm, tantos quantos os temores também eles válidos, que todos os dias nos podem fazer acreditar, que esta mesma Democracia está ameaçada e em risco de fenecer.
Num momento em que uma das questões fundamentais é a sobrevivência da humanidade enquanto espécie, a questão da Paz, deveria ser a temática mais importante de todas a ensinar nas escolas. A par da educação para uma ecologia do Ser, capaz de aprender a cuidar de si mesmo, da relação com o outro, da vida em sociedade, no respeito pelo outro, e em comunidade, e na relação com o Planeta, numa aprendizagem aberta a várias formas de cuidar a Terra de forma sustentável, indo mais além, e gerando uma cultura regenerativa, capaz de educar para preservar e restaurar o que temos destruído, em termos de recursos naturais, que já não tem retorno nos seus ciclos naturais.

Só haverá liberdade a sério quando tivermos uma educação que dê este passo seguinte, que seja integradora de uma cultura de paz, promotora da participação activa de todos, que promova essa democracia de baixo para cima, que reúna com todo o ecossistema de ensino: alunos, professores, funcionários, pais, comunidade, direções gerais de ensino, delegações de investigação e de inovação, núcleos de pesquisa de educação transformadora, ministro da educação, todos juntos a cumprir Abril. ◼️