Agendado: 16 de Março 2021
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Publicação em BM:
VOTO DE SAUDAÇÃO
PELA RESILIÊNCIA FEMININA – A PROPÓSITO DA COMEMORAÇÃO DO DIA INTERNACIONAL DA
MULHER
A necessidade de haver uma data para comemorar, homenagear e despertar a sociedade para
os direitos da Mulher começou no princípio do Sec. XX, nos Estados Unidos da América. Porém,
foi apenas em 1975 que as Nações Unidas decidiram proclamar o dia 8 de Março como o Dia
Internacional da Mulher.
Esta data, 8 de Março, foi especificamente escolhida por ser marco das origens do movimento
feminista que, dentro dos movimentos operários, lutavam contra a jorna de 15 horas e salários
de miséria: a 8 de Março de 1857 em Nova Iorque, algumas operárias do sector têxtil levaram a
cabo uma marcha-protesto, exigindo melhores condições de trabalho, uma jorna de 10 horas e
direitos iguais aos dos seus colegas do género masculino. A 8 de Março de 1908, outras
trabalhadoras nova iorquinas escolheram a data para marcar uma greve, em homenagem às
antecessoras, reinvindicando agora o fim do trabalho infantil e o direito de voto.
São inquestionáveis os progressos na vida das mulheres que foram feitos desde o princípio do
Sec. XX – os movimentos feministas, na sua multiplicidade, adquiriram para as mulheres direitos
que tanto(a)s esquecem o quão duros foram de conquistar: votar, estudar, trabalhar e ser dona
do próprio salário, viajar em trabalho, engravidar e não ser despedida por tal, deter
propriedade, pedir um empréstimo, contracepção, aborto, pedir o divórcio, testemunhar em
sua própria defesa, concorrer a cargos públicos, servir nas forças armadas, usar calças…
Embora até meados da década passada fosse quase-radical alguém proclamar-se feminista, a
necessidade do feminismo entrou agora, pelo menos no discurso político. Ainda bem. Falta
levá-lo para dentro da vida da esmagadora maioria das pessoas, mas deixou de ser tabu.
Assim (nunca é demais repeti-lo!) usemos então da efeméride para relembrar a 49,5% da
população portuguesa o que 50,5% sabe bem: que este segundo grupo, o das mulheres, além
de prover para a economia familiar (segundo o Eurostat, em média menos 10,6%
[*1]), todos os dias leva a cabo mais 1h45m de trabalho não remunerado do que os homens, segundo um
estudo comparativo dos usos do tempo por homens e mulheres [*2].
Urge dar um valor mensurável a estas 45 horas mensais de trabalho não pago! – Louvamos por
isso o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 14 de Janeiro, que confirmou a condenação de um homem ao pagamento de mais de 60 mil euros à ex-companheira, pelo trabalho doméstico que esta desenvolveu ao longo de quase 30 anos.
“O trabalho doméstico, embora continue a ser estranhamente invisível para muitos, tem
obviamente um valor económico e traduz-se num enriquecimento enquanto poupança de
despesas”, diz este acórdão: é a abertura do caminho ao reconhecimento público desta
realidade!
Para além de ganharem menos e contribuirem com trabalho não remunerado para a economia
doméstica, as mulheres têm de facto menos menos 45 horas por mês de tempo livre que os
homens.
Não aceitamos que as mulheres ganhem menos na remuneração-base nas mesmas funções que
os homens, pois isso seria crime. Porém, não podemos ignorar que muitas vezes são menos
promovidas porque não podem ir a reuniões fora de horas, não podem fazer horas
extraordinárias, não podem viajar tanto a trabalho, porque têm de sair às cinco para ir buscar
os filhos à escola, porque têm de ficar em casa quando os filhos estão doentes, porque têm de
cuidar dos familiares mais velhos, porque têm de fazer as compras e o jantar, porque têm de
arrumar a casa, porque a igualdade das responsabilidades parentais e da gestão da economia
doméstica continua a recair nas mulheres.
A esta triste conjuntura, acresce a pandemia.
As mulheres têm sofrido mais com o desemprego decorrente da crise sanitária e económica – já
que grande parte do trabalho precário e sem vínculo laboral é exercido por elas.
As mulheres que mantêm as actividades profissionais, têm de o fazer fora de casa em maior
número do que os homens: os trabalhos “essenciais, que são ocupados por elas, são em muitos
casos os mais mal pagos.
As mulheres são mais contagiadas que os homens com o SARS-Cov-2, porque estes trabalhos
essenciais as expõem mais fora de casa.
As mulheres foram ainda sobrecarregadas com o excesso de trabalho doméstico decorrente da
permanência de toda a família dentro de casa.
As mulheres têm sido mais vítimas da violência doméstica do que já costumavam ser (assim
como o outros grupos vulneráveis, como crianças e idosos).
As mulheres, como de costume, como todos aceitam, como se fora normal, têm sofrido mais
com a pandemia.
Assim, os Deputados Municipais Independentes Cidadãos Por Lisboa, ao abrigo do disposto
no n.º 12, do art.º 48.º do Regimento, propõem à Assembleia Municipal de Lisboa que, na sua
sessão plenária de 16 de Março de 2021, delibere:
Saudar calorosamente todas as mulheres e reconhecer que sem a sua resiliência e o seu
altruísmo – tantas vezes ignorado pela sociedade – esta crise pandémica seria mais grave, mais
difícil e menos solidária. Para tanto, instamos cada um de nós a uma introspecção política, no
sentido de mudar o status quo feminino.
Os Deputados Municipais Independentes Cidadãos Por Lisboa,
Ana Gaspar, António Avelãs, Joana Alegre Duarte,
José Alberto Franco, Maria Teresa Craveiro, Miguel Graça
Lisboa, 15 de Março de 2021