Agendada: 7 de Maio de 2019
Debatida e votada: 7 de Maio de 2019
Resultado da Votação: Aprovada por maioria com a seguinte votação: Favor: PS/ PSD/ PCP/ CDS-PP/ BE/ PEV/ MPT/ 10 IND – Abstenção: PAN/ PPM
Passou a Deliberação: 200/AML/2019
Publicação em BM:5º Suplemento BM 1318
RECOMENDAÇÃO
LISBOA, CIDADE DA TOLERÂNCIA
Na vida da Cidade de Lisboa ao longo dos séculos, verificaram-se acontecimentos, situações e momentos, de intolerância, violência e fanatismo, que não podemos deixar de considerar como fazendo parte do passivo do seu passado, sem esquecer igualmente o contributo dos seus cidadãos e residentes para a sua superação, para os progressos da consciência histórica e da emancipação cívica, não só a nível do país como do mundo.
Em 19 de abril passou mais um ano sobre um desses trágicos acontecimentos, o massacre de judeus ocorrido em 19 de abril de 1506.
A forma como a Cidade lida com essa memória, marca também o futuro de tolerância que queremos construir.
Durante três dias a partir da pregação de frades dominicanos, populares e marinheiros estrangeiros, exerceram toda a sorte de violências sobre os judeus, e os então denominados de “cristãos-novos”, matando entre dois mil a quatro mil, num contexto marcado pela seca e pela peste, que tinha inclusive levado o rei D. Manuel a ausentar-se para Abrantes. Estes trágicos acontecimentos só vieram a terminar com a intervenção do rei que castigou severamente o povo de Lisboa: sentenciou os responsáveis da chacina com penas corporais e a perda dos seus bens a favor da Coroa; mesmo os que não tivessem participado no massacre e no saque perdiam um quinto dos seus bens; suspendeu a eleição dos representantes da Casa dos Vinte e Quatro e os seus representantes na vereação municipal; mandou executar cerca de meia centena de amotinados e os dois frades dominicanos instigadores do massacre.
Em 19 de abril de 2006 nos 500 anos deste massacre verificaram-se vários atos de memória por parte da comunidade judaica e daí partiu a ideia de não apagar a memória e evocá-la de forma duradoura numa ótica de recordação e reconciliação, tomando-os como ponto de partida para atos e gestos que servissem de pedagogia para a sua não repetição e para a afirmação de Lisboa como Cidade da Tolerância.
Foi assim decidido que o Largo de São Domingos, local onde no passado se verificaram graves crimes contra os judeus e “cristãos-novos”, se erguesse um memorial, composto por três peças: uma da iniciativa da comunidade judaica, em que se lê na base a frase de Job “Ó terra não ocultes o meu sangue, não ocultes o meu clamor” e na parte de cima “Em memória dos milhares de judeus, vítimas da intolerância e do fanatismo religioso assassinados no massacre iniciado a 19 de abril de 1506 neste largo”; outro da iniciativa da Igreja Católica em que se assume um pedido público de perdão do Patriarca de Lisboa. D. José Policarpo, e se afirma, «nomeadamente”(..) nem devemos esquecer, neste lugar, a triste sorte dos “cristãos-novos”: as pressões para se converterem, os motins, as suspeitas, as delações, os processos temíveis da Inquisição”»; e um mural em que a Câmara Municipal de Lisboa proclama, com clareza, em 34 línguas “Lisboa, Cidade da Tolerância”.
A sua inauguração foi um momento de memória e verdade, mas as pedras só mantêm o seu significado histórico e simbólico, se forem pedras vivas que nos acompanham na construção do futuro.
Constatamos que muitos cidadãos, ignoram a sua existência e o seu significado, que muitos o degradam com a sua incivilidade, o que é um empobrecimento para a nossa consciência histórica coletiva. Não podemos pactuar nem com a ignorância dos massacres de 1506, que atingiram entre dois mil a quatro mil judeus em Lisboa, nem com a ignorância dos gestos de memória reconciliação realizados em abril de 2008, e o memorial que os pretendeu inscrever para sempre na vida da Cidade.
Nestes termos, o Grupo Municipal do PS propõe que a Assembleia Municipal de Lisboa, delibere recomendar à Câmara Municipal:
a) Que a Câmara Municipal de Lisboa prossiga em todas as suas ações e políticas municipais o seu compromisso com a Tolerância, o respeito pela liberdade de consciência, religião e culto dos cidadãos e pelas suas expressões individuais e coletivas no quadro da Constituição da República e a sua recusa de discriminações com base, nomeadamente, em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
b) Que o memorial inaugurado em 19 de abril de 2008, no Largo de São Domingos em memória dos judeus vítimas da intolerância e do fanatismo assassinados no massacre ocorrido a 19 de abril de 1506, composto por três peças, seja restaurado e conservado de forma exemplar para que se não apague a memória e seja objeto de divulgação, através das publicações, e de iniciativas educativas e culturais com a participação do município;
c) Recomendar à Câmara Municipal de Lisboa que tenha em conta nas suas iniciativas a preocupação de dar rosto e voz à diversidade de culturas que faz de Lisboa uma cidade cosmopolita e de contribuir para a educação cívica para a tolerância, que promova o respeito pela dignidade, a identidade e os direitos de todos os seres humanos.
d) Manifestar a disponibilidade desta Assembleia Municipal para participar, no quadro das suas competências e possibilidades, nas iniciativas que se realizem na Cidade que visem promover o respeito pela dignidade de todos os que nela residem ou trabalham.
e) Que seja enviada cópia desta recomendação à CIL – Comunidade Israelita de Lisboa e à CLR – Comissão da Liberdade Religiosa.
Pelo Grupo Municipal do PS
José Leitão
Os Deputados Municipais Independentes dos Cidadãos por Lisboa,
Joana Duarte
Miguel Graça
José Alberto Franco
Ana Gaspar
Maria Teresa Craveiro
Maria das Dores Ribeiro