Agendada: 21ª reunião, 8 de Abril de 2014
Debatida e votada: 8 de Abril de 2014
Resultado da Votação: Aprovada por Maioria com a seguinte votação: Favor – PS/ PCP/ BE/ PEV/ MPT/ PAN/ PNPN/ 6 IND – Abstenções – PSD/ CDS-PP
Passou a Deliberação: 67/AML/2014
Publicação em BM: BM nº 1054
Moção
Pelo financiamento da construção e reabilitação de habitação pública municipal
Considerandos:
1. O direito à habitação está consagrado no artigo 65~ da Constituição da República
Portuguesa como um direito fundamental de todos os cidadãos, impondo ao Estado
um conjunto de obrigações que não tem vindo a ser cumpridas.
2. A criação de condições para o acesso a este direito através do mercado de habitação
tem sido insuficiente ao longo de gerações.
3. O Município de Lisboa tem uma longa tradição de investimento em habitação
pública municipal e na sua cedência ou arrendamento em condições acessíveis,
detendo actualmente cerca de 22 mil fogos para esse fim.
4. Foi o grande esforço financeiro levado a cabo pelo município de Lisboa desde a
década de 80, através do PIMP (Programa de Intervenção a Médio Prazo) e, a partir de
1993, através do PER (Programa Especial de Realojamento), os quais permitiram
erradicar o fenómeno dos bairros de barracas. Lisboa construiu cerca de 17.000 fogos
ao abrigo desses dois programas e ainda está a pagar o endividamento então
contraído para o efeito.
5. Passados mais de 20 anos sobre o lançamento do PER, muitas das habitações e
bairros então construídos carecem de manutenção e requalificação. Subsistem, por
outro lado, habitações e bairros municipais mais antigos, de que são paradigmáticos os
Bairros Padre Cruz, Boavista, 2 de Maio ou as Torres do Alto da Eira, que carecem de
requalificação profunda ou mesmo substituição integral das zonas mais antigas, como
é o caso das “alvenarias” do Padre Cruz e da Boavista, totalmente obsoletas e até
perigosas devido às coberturas em fibrocimento.
6. O lançamento do PER à escala nacional só foi possível porque foram criadas
condições financeiras excepcionais que permitiram aos municípios aceder à concessão
pelo Estado de apoios a fundo perdido e de contrair empréstimos de longo prazo
excepcionados dos limites de endividamento legais.
7. Está a chegar ao fim o prazo de execução do chamado “memorando de
entendimento” entre Portugal, a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o
Fundo Monetário Internacional. Este “memorando”, em conjunto com as regras
orçamentais em vigor na UE, impôs limites muito rígidos ao endividamento público, o
que teve, entre outras consequências, a de uma maior restrição aos limites de
ASSEMBLEIA MUNICIPAL DE LISBOA
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endividamento das autarquias, fixados na nova lei das finanças locais que entrou em
vigor em 2014 (Lei n.2 73/2013, de 3 de Setembro).
8. O empobrecimento a que assistimos em Portugal nos últimos anos, ao abrigo do
referido “memorando de entendimento” e das políticas de austeridade lançadas pelo
governo português, está a ter inúmeros reflexos na redução do bem estar e da
qualidade de vida dos portugueses, bem como no seu acesso aos direitos sociais
consagrados na Constituição da República Portuguesa.
9. Um dos vectores em que é manifesto o empobrecimento e mesmo a exclusão de
largas camadas da população é a dificuldade de acesso a habitação adequado, em
condições compatíveis com a sua capacidade económica.
10. A nova lei das rendas e a quase inexistência de apoios financeiros públicos para
construção, reconstrução, reabilitação e requalificação de habitação, a par da queda
de rendimentos da maioria dos portugueses, fazem com que o município disponha de
poucos meios para fazer frente, através da intervenção municipal, ao crescimento de
fenómenos graves como o dos fogos devolutos e das pessoas sem abrigo. Entretanto,
crescem as suas responsabilidades na manutenção e requalificação do parque
habitacional municipal e na capacidade de resposta à demanda de habitação das novas
gerações.
11. É nossa convicção que não é possível fazer frente ao empobrecimento e erosão dos
direitos sociais dos portugueses sem uma forte intervenção municipal, sustentada em
meios patrimoniais e financeiros próprios, dada a gravidade e extensão das carências.
12. Está na altura de ser reequacionada a capacidade dos poderes públicos para
garantir a coesão social e territorial e o acesso aos direitos sociais. A dimensão da
exclusão em matéria de habitação é distinta da alcançada no século XX pela
proliferação das barracas mas deixa marcas porventura mais fundas nos excluídos. E a
permanência de milhares de famílias em habitações públicas e privadas em péssimo
estado de conservação tem igualmente consequências graves no bem estar e na saúde
de quem nelas reside.
Assim, e por todas as razões de fundo e de calendário, quando se aproxima o fim do
prazo do “memorando de entendimento” e o lançamento da estratégia Europa 2020,
propomos que a Assembleia Municipal delibere:
a) Exigir dos órgãos de soberania que criem condições para uma verdadeira polftica
pública de habitação, nomeadamente através de uma Lei de Bases da Habitação que
traduza em preceitos legais permanentes o artigo 652 da Constituição da República
Portuguesa;
b) Exigir do governo que estabeleça de imediato conversações com o poder local
democrático no sentido de definir, com carácter de urgência, programas de
intervenção na habitação pública, ao nível da construção, manutenção, reabilitação,
requalificação e condições equitativas de acesso;
c) Em especial, negociar em termos europeus e fixar na legislação nacional a
possibilidade de os municípios poderem contrair empréstimos de longo prazo para
construção, manutenção, reabilitação e requalificação do parque habitacional
municipal, excepcionando esses empréstimos, à semelhança do que aconteceu com
o PER, dos limites de endividamento fixados pela Lei das Finanças Locais.
d) Enviar esta moção para a mesa da Assembleia da República e para todos os
Grupos Parlamentares nela representados, para o Governo, para o IHRU e para a
Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Lisboa, ide Abril de 2014
Pelos Deputados Independentes
Helena Roseta